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Tópico - Testemunho - Alberto Neves de Melo


Utilizador Alberto Neves de Melo, Citar


Olá, Boa Tarde,


Em Maio de 2008, aos 44 anos de idade, por acaso, foi-me diagnosticado um cancro raro, um GIST no instestino delgado, um tumor maligno de alto risco.


Na segunda colonoscospia (02.05.2008) continuavam a não encontrar a “fonte” da hemorragia; na quarta endoscopia digestiva alta (EDA) (02.05.2008) também não; na vídeo-cápsula endoscópica (exame realizado em 14.02.2008, com relatório de 10.03.2008) nada de conclusivo…. Só aqui, perante o continuar das graves hemorragias digestivas, optaram por solicitar uma Angio TAC (abdominal e pélvica) (realizada em 30.04.2008, com relatório conhecido em 09.05.2008), altura em que já falavam em realizar endoscopia de duplo balão (EDB) para conseguirem examinar com maior detalhe o intestino delgado.


Neste período – 11.02.2008 a 09.05.2008 (data em que foi conhecido o relatório “conclusivo” da Angio TAC) – eram inequívocas as persistentes hemorragias digestivas, confirmadas pelas fezes (negras, cor de alcatrão, por fim já com sangue “vivo”) e pelos exames laboratoriais, nomeadamente com valores de hemoglobina perigosamente baixos, a requererem frequente suporte transfusional (13 unidades de UCE), para além de outras terapêuticas. Foi o pior período da minha vida!


Ninguém, tal como eu, pensava em cancro, nem sequer num tumor benigno; a descoberta do cancro permitiu controlar rapidamente as hemorragias potencialmente fatais, pondo fim ao pior período da minha vida.


Apesar do “choque” da notícia/diagnóstico (os médicos, durante cerca de três meses (11.02.2008 a 09.05.2008), em busca da causa das graves hemorragias digestivas, inequívocas mas de “etiologia desconhecida” e/ou “obscuras”), a descoberta do cancro permitiu controlar rapidamente as hemorragias potencialmente fatais. Foi um “choque” “suavizado” pelo fim do risco de morte eminente que sofrera desde 11.02.2008


Fui operado logo no dia 11.05.2008, um Domingo. Realizaram uma enterectomia segmentar a tumor exofítico no intestino delgado, isto é, em linguagem não clínica: retiraram cerca de 12 cm do intestino delgado.


O relatório de Anatomia Patológica confirmou as suspeitas: tratava-se de um tumor do estroma gastro-intestinal (GIST), com pleomorfismo por vezes marcado, com alto índice mitótico, com áreas de necrose, de alto risco, com metastização ganglionar.


Inicialmente, no dia 26.06.2008, face à revelação clara de sofrer de um cancro – um GIST de alto risco (com três factores de risco acrescido) -, senti-me algo “perdido”, com algumas incertezas, sem saber por onde começar ou continuar a “lutar” pela sobrevivência.


A notícia foi-me transmitida pela minha Médica Cirurgiã, em consulta de Cirurgia. Procurou encaminhar-me logo para o Serviço de Oncologia, mas o Médico que me destinaram estava de férias. Com o relatório de Anatomia Patológica, procurei logo outro médico, noutro hospital – que trabalhava na área oncológica – obtendo algum sossego até conseguir a primeira consulta no Serviço de Oncologia do Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca (Amadora/Sintra).


Quando recebemos o diagnóstico concludente de ter um cancro, um tumor maligno (relatório de Anatomia Patológica e exame para estadiamento funcional inicial), “desligamos” - por mais que o profissional de saúde fale honestamente, o doente não ouve cerca de noventa por cento (90%) do resto das coisas que o médico diz - e, nessa consulta, não conseguimos tomar decisões ou pensar nos nossos direitos e deveres.


A primeira consulta no Serviço de Oncologia do Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca (Amadora/Sintra) foi somente no dia 23 de Julho de 2008, onde tive a sorte de encontrar um Médico Oncologista extremamente competente, que me transmitiu claramente vasta informação sobre o presente e o futuro. Saí da consulta com VIDA renovada e disposto a adoptar prontamente toda a terapêutica proposta (incluía também ter de perder peso e promover uma alimentação mais saudável).


Logo tentei também de começar a reunir toda a informação possível, considerando também a relevância social do direito à protecção da saúde.


Esta questão revela-se especialmente relevante e com importantes repercussões a nível social nos doentes do foro oncológico, em busca da sobrevivência condigna, para o doente e para a sua família.


As instituições – públicas e privadas – que contactei não me esclareciam suficientemente e, aliás, desconheciam até o que era um GIST, assim como a generalidade das normas legais aplicáveis em termos de direitos e deveres do doente oncológico.


Após vários obstáculos e muita desinformação, face às dificuldades sentidas, resolvi escrever e partilhar um Guia, designadamente para tentar ajudar quem tem de lidar directamente com o cancro, com o sofrimento provocado por um tumor maligno.


O «Guia dos Direitos e Deveres do Doente Oncológico» – entre muitos conselhos para tentar evitar o cancro e melhorar a saúde - também inclui uma compilação e referências às normas legais existentes, destinando-se a todas as pessoas, especialmente às que vivem com cancro, mas também aos seus familiares, às associações de doentes, às entidades patronais, aos profissionais de saúde em geral, e aos oncologistas em especial. Está em permanente actualização, designadamente com artigos que coloco no blog http://escritosdispersos.blogs.sapo.pt/ .


Com o Guia pretende-se ajudar todos os que necessitem recorrer a uma fonte na procura de dados que lhes permitam caminhar nesta nova fase da vida, que não tem de acabar prematuramente.


Mesmo os profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e terapêutica, por exemplo) ainda desconhecem muita da legislação, da norma legal aplicável à actividade que desenvolvem.


A sua profissão é extremamente exigente e, face ao empenho no tratamento dos doentes e à dispersão de informação, não conseguem dedicar tempo suficiente à procura do que a lei diz, desconhecendo normas legais muito úteis aos profissionais de saúde, aos doentes em geral e aos doentes oncológicos em particular.


Existem leis ou normas legais e regulamentares demasiado dispersas, que abrangem áreas muito diversas: a saúde, o emprego, os transportes, a educação, as acessibilidades, as questões fiscais, a habitação, os direitos do doente e da família, o acesso a tratamentos, a obtenção de produtos de apoio, a acção social, entre outras.


O «desvario legislativo», torna o trabalho desgastante, por vezes frustrante e ambíguo ou aleatório quanto ao resultado, mas, tenciono continuar discreta e mais intensamente disponível para quem mais precisa, procurando ser útil, dedicando mais tempo à promoção da saúde, tarefa que vai muito além da Medicina ou do Direito.


A pessoa com cancro também pode ter associadas limitações e/ou deficiências, que justificam o impedimento de exercer capazmente as suas funções laborais e sociais, bem como a necessidade de produtos de apoio e cuidados continuados.


Destaco a importância de todos os intervenientes – doentes e cuidadores - conhecerem bem o respectivo processo clínico, tratarem de obter a isenção de taxas moderadoras, o atestado médico de incapacidade multiusos, onde deverá constar o respectivo grau de deficiência, e poderem receber, mediante prescrição (de preferência por equipa técnica multidisciplinar ou por médico especialista), produtos de apoio (anteriormente designados de ajudas técnicas) (qualquer produto, instrumento, equipamento ou sistema técnico usado por uma pessoa com deficiência, especialmente produzido ou disponível que previne, compensa, atenua ou neutraliza a limitação funcional ou de participação) (cabeleiras, próteses, sacos de ostomia, cadeiras de rodas, computadores, etc. (a lista completa são cerca de quatro páginas do Diário da República).


Graças a deus continuo a ser sobrevivente de um cancro que há poucos anos era normalmente fatal (não havia terapêutica adjuvante)!


E como os direitos também implicam deveres, finalizando, alerto para a necessidade de se adoptar com muito rigor os aconselhamentos médicos, colaborando na concretização das terapêuticas prescritas, de maneira a ajudarmo-nos a nós próprios, ao médico, aos restantes profissionais de saúde e aos nossos familiares, que tanto sofrem nestes momentos.


O cancro está a aumentar… mas a sobrevivência ao cancro também…!


NUNCA percam a esperança!!! Um ABRAÇO solidário.


11-06-2011, 10:24
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